Folha de São Paulo Editoria: Dinheiro Página: B-1
Pela primeira vez, a sociedade civil está se unindo para apresentar sua proposta de reforma tributária ao governo.
Folha de São Paulo Editoria: Dinheiro Página: B-1
Pela primeira vez, a sociedade civil está se unindo para apresentar sua proposta de reforma tributária ao governo. Um grupo multissetorial formado por 30 entidades como Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Febraban (Federação Brasileira dos Bancos), Secovi (Sindicato das Empresas de Imóveis) e CUT (Central Única dos Trabalhadores) tem se reunido para fechar uma proposta consensual e levá-la ao presidente Lula até julho.
“Sempre que as mudanças nas leis tributárias foram conduzidas apenas pelo governo, o resultado foi, invariavelmente, uma colcha de retalhos que tornou o sistema mais complexo e aumentou de carga”, afirma Antoninho Marmo Trevisan, sócio da empresa de auditoria BDO Trevisan, que coordena os trabalhos. “Chegou a vez de a sociedade civil fazer sua parte.”
Em 2005, a pressão de uma frente formada por mais de mil entidades civis teve sucesso na luta contra a elevada carga tributária ao barrar a aprovação da medida provisória 232, que elevava impostos de prestadores de serviços.
Consenso
Entre as sugestões propostas pelo grupo, estão algumas que são consenso, inclusive no governo, como a criação de um IVA (Imposto sobre Valor Agregado) federal e outro estadual, substituindo os chamados “impostos de faturamento”. Entre eles, estão o imposto dos produtos industrializados IPI, o de mercadorias ICMS e os sociais PIS e Cofins. O objetivo seria simplificar o sistema.
Outras propostas, entretanto, são bem mais polêmicas e difíceis de serem aprovadas. Uma delas é a criação de um teto para a crescente carga tributária do país- de 30% em relação ao PIB. O percentual final ainda está sendo discutido. A carga hoje é estimada em cerca de 35% do PIB.
Pela proposta, haveria uma medição periódica da arrecadação do governo. Toda vez que a carga federal ultrapassasse o teto, a diferença seria devolvida para o contribuinte, na forma de redução do IVA federal ou do Imposto de Renda (IR).
Segundo o IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário), em 2006, o brasileiro trabalhou quatro meses e 26 dias para pagar tributos. Isso equivale, em média, a 40% do seu rendimento. O percentual vem aumentando ano a ano
“O governo tem de aprender a reduzir seus custos para não sacrificar a sociedade no aspecto tributário”, afirma Paulo Skaf, presidente da Fiesp.
Segundo Hélcio Honda, juiz do Tribunal de Impostos e Taxas e assessor jurídico da Fiesp, que participa do grupo, seria uma espécie de gatilho compensatório para evitar aumento na carga.
Tributaristas, no entanto, ressaltam que dificilmente essa proposta será aprovada. “A intenção de colocar um freio no governo é louvável”, diz Gilberto Luiz do Amaral, presidente do IBPT. “Porém fixar um limite de carga tributária na Constituição seria engessar e não resolver o problema.”
Para Luiz Borges D’Urso, presidente da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil) e um dos participantes do grupo, juridicamente não há problema em colocar o gatilho na Constituição e regulá-lo depois, com leis infraconstitucionais.
“Na verdade, o que buscamos é um contraponto da população à sanha arrecadadora do governo”, diz D’Urso. “Queremos criar um pacto de toda a sociedade e, com a redução almejada, trazer todos os contribuintes para a legalidade.”
Debate
Para o Ministério da Fazenda, a proposta de reforma tributária foi lançada para estimular esse tipo de debate.
“Temos o maior interesse na convergência de propostas”, diz André Paiva, secretário-adjunto da Secretaria de Política Econômica. “Assim, quando o projeto for apresentado ao Congresso, em agosto, a celeridade será maior.”
Para ele, no entanto, o projeto final não poderá significar qualquer tipo de perda para os entes públicos, sejam municípios, Estados e União. Nem para os contribuintes. “A intenção é fazer um modelo mais simples, neutro e pragmático”, afirma. Sobre o gatilho, Paiva afirma que irá a discussão se for apresentado.
Reforma não diminuirá a carga, dizem especialistas
Apesar de louvarem a iniciativa dos contribuintes em fazer uma proposta consolidada de reforma tributária, tributaristas advertem que, provavelmente, ela não terá o esperado efeito de reduzir a carga.
Isso porque, explicam, a carga é determinada por alíquotas, estabelecidas em leis infraconstitucionais. Ou seja, se em 2008 a emenda constitucional da reforma tiver sido aprovada, como pretende o governo, ainda será preciso acompanhar de perto as leis votadas posteriormente, que determinarão as alíquotas dos impostos.
“É importante que a sociedade tenha presente que a reforma tributária não existe para reduzir carga”, afirma Gilberto Luiz do Amaral, presidente do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário).
Segundo ele, o que o governo oferece, até agora, é uma simplificação do sistema, ao juntar vários tributos no IVA (Imposto sobre Valor Agregado).
“Para reduzir a carga, não é necessário fazer nenhuma reforma”, diz ele. “O que impede o governo de reduzir a CPMF ou o ICMS?”
A resposta, muitos dos empresários que participam do grupo multissetorial têm na ponta da língua:
“Antes de reformas, precisamos de um completo processo de gestão, que tape os ralos do governo”, afirma Alencar Burti, presidente da Associação Comercial de São Paulo.
“O tamanho do Estado brasileiro está sacrificando toda a sociedade e punindo o futuro do país”, diz Abram Szajman, presidente da Federação do Comércio de São Paulo.
Para os especialistas, há ainda dúvidas com relação a algumas propostas elaboradas pelo grupo multissetorial. Entre elas, a que prevê um fundo de compensação que, durante algum tempo, diminuiria as perdas de empresas beneficiadas por guerras fiscais entre Estados como ocorreu com as montadoras. “São contratos de mais de 20 anos, e acho difícil que possam ser quebrados”, diz Clóvis Panzarini, da CP Consultores.