Desoneração ainda insuficiente

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O discurso desenvolvimentista adotado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva gerou otimismo no mercado sobre uma possível redução da carga tributária no Brasil, apontada pela consultoria KPMG como sendo a décima sétima mais alta no mundo sobre empresas. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse na última semana que a União pretende reduzir tributos no próximo ano, depois de admitir aumento dos impostos na atual gestão.

O discurso desenvolvimentista adotado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva gerou otimismo no mercado sobre uma possível redução da carga tributária no Brasil, apontada pela consultoria KPMG como sendo a décima sétima mais alta no mundo sobre empresas. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse na última semana que a União pretende reduzir tributos no próximo ano, depois de admitir aumento dos impostos na atual gestão. Para executivos e especialistas, contudo, uma redução passaria antes pela aprovação de uma reforma tributária mais ampla no Congresso Nacional e melhor controle de gastos públicos.


Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), a carga tributária (soma de impostos, taxas e contribuições federais, estaduais e municipais arrecadados) apresentará crescimento de 0,9 ponto percentual neste ano, passando dos 37,82% do Produto Interno Bruto (PIB), registrados no ano passado, para 38,72% do PIB. No primeiro semestre do ano, a carga tributária cresceu para 39,79%, aumento de 0,63 ponto percentual frente aos 39,16% de igual período de 2005. O peso da carga tributária sobre o PIB é maior nos primeiros seis meses do ano.


Queda da carga


O presidente do IBPT, Gilberto Luiz do Amaral, diz acreditar que a carga tributária brasileira poderá apresentar queda – embora não na medida necessária – no próximo ano, com base na série de medidas que vêm sendo anunciadas pelo governo federal, desde que não ocorra aumento em outras alíquotas. A desoneração anunciada envolve a renúncia fiscal de aproximadamente R$ 12 bilhões, incluindo a ampliação do prazo para que as empresas aproveitem créditos de PIS/Cofins na compra de materiais de construção civil e a inclusão de 50 itens na lista de bens de capital com isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).


Amaral afirma que as medidas são positivas, mas acrescenta que ainda não são suficientes para uma efetiva redução da carga tributária brasileira. “É um pouco difícil prever o comportamento da carga tributária no próximo ano, já que uma medida do governo pode mudar qualquer projeção. O certo é que os pacotes pontuais anunciados ainda são poucos para uma efetiva queda, que demanda redução de tributos de uma forma geral, incluindo o Imposto de Renda. A reforma tributária seria muito importante, mas sou um pouco cético sobre sua implementação na atual gestão”, diz Amaral.


No primeiro semestre deste ano, a arrecadação tributária apresentou crescimento nominal de 9,2% (ou R$ 33,09 bilhões) e variação real pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 5,04% (correspondendo a R$ 18,85 bilhões). Os tributos federais totalizaram R$ 269,52 bilhões, os estaduais R$ 102,96 bilhões e os municipais, R$ 20,3 bilhões. O estudo do IBPT revela que a carga tributária per capita do primeiro semestre, em comparação a igual período do ano passado, apresentou crescimento de 8,97%. Pela projeção da pesquisa, cada brasileiro pagará R$ 4.380 em impostos neste ano, R$ 392,54 a mais que os R$ 3.987,46 pagos em 2005.


O advogado Hélcio Honda, assessor da presidência da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), afirma que o ambiente está propício para redução da carga tributária, o que incentivaria investimentos do setor produtivo e aumento de competitividade brasileira. Ela diz acreditar que o novo discurso do governo será convertido em simplificação e redução dos impostos, mas acrescenta que isso não ocorrerá se for mantido o modelo de reforma tributária que está no Congresso Nacional, que prevê basicamente a simplificação das alíquotas do imposto estadual, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).


“A reforma tributária encaminhada ao Congresso Nacional aumentará a carga tributária e sua complexidade. Defendemos uma ampla reforma, caracterizada pela simplificação do sistema mediante redução do número de tributos, a extinção das contribuições e a conseqüente redução da carga. Entendemos que o sistema tributário deve se alicerçar em cinco impostos que alcancem apenas o lucro, o consumo e a propriedade. Somos favoráveis ainda à desoneração dos bens de capital”, diz o advogado, defendendo ainda a adequação do prazo de recolhimento dos tributos às práticas comerciais.


Honda acrescenta que o momento exige ainda o corte do gasto público, nos três níveis de governo. Esse controle seria imprescindível, segundo ele, porque na medida em que os gastos públicos declinarem ou se estabilizarem, a restrição do crescimento da carga tributária seria reduzido. “Só haverá redução da carga quando houver redução de gastos públicos, o que não vem ocorrendo. Esperamos que essa promessa de campanha possa se tornar realidade”, afirma.


O advogado tributarista da Veirano Advogados, Henry Lummertz, lembra que os itens da reforma tributária aprovados desde 2003 apenas aumentaram o volume de impostos, como a renovação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) em alíquota superior à anteriormente cobrada. Ele afirma que a redução dos tributos, apesar do discurso do governo, não está em pauta hoje quando o assunto é reforma tributária. “O que está sendo discutido hoje é para quem os contribuintes pagarão a mais”, afirma Lummertz, acrescentando que os contribuintes foram “solenemente ignorados” nas discussões.


Nova reforma


O ministro Guido Mantega afirmou na última semana que o governo federal vai procurar individualmente cada um dos 27 governadores para propor nova reforma tributária. Mantega disse ser necessário um “conjunto tributário amadurecido”, com desoneração e simplificação dos impostos. Para isso, o governo pretende modificar o texto que está no Congresso, que jamais foi votado na íntegra. “Queremos uma reforma tributária mais ambiciosa”, completou o ministro, que disse acreditar na “sensibilidade política” para a aprovação de um novo texto no Congresso Nacional.


O peso dos impostos sobre as empresas foi analisado pela consultoria KPMG, que avaliou os movimentos tributários em 86 países. O estudo mostra que, enquanto o Brasil aumentou sua carga nos últimos dez anos, os países considerados mais ricos do mundo diminuíram a cobrança de tributos. A tributação média sobre uma empresa no Brasil é de 34% sobre a receita bruta anual, percentual superado apenas por 16 economias entre as nações avaliadas. De acordo com o estudo, os tributos incidentes sobre empresas no mundo giram em torno de 27,1%. Na América Latina, a média é de 28,1%.


Sonegação


Um dos resultados da elevada carga tributária é o aumento da sonegação de impostos. Segundo o vice-presidente executivo do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes (Sindicom), Alísio Vaz, os altos impostos funcionam como uma espécie de âncora ao crescimento das pequenas empresas, que buscam na informalidade maneiras de se tornarem mais competitivas. Com isso, elas reduzem a arrecadação dos governos e forçam outras empresas, que pagam impostos, a reduzirem suas margens de lucro para manterem preços competitivos, distorcendo o mercado.


O setor de combustíveis está entre os que mais sofrem com as distorções provocadas pela alta carga tributária brasileira. Segundo Vaz, as distribuidoras estão registrando prejuízos em diversas regiões porque precisam manter preços competitivos frente aos de postos sonegadores. “É possível reduzir impostos sem diminuir a arrecadação, como ocorreu em São Paulo. Reduzindo a carga tributária sobre distribuidoras, que está atualmente em 27% na média nacional, é possível atrair empresas para a formalidade. O mesmo vale para diversos segmentos da economia”, diz o executivo.


De acordo com outro estudo do IBPT, foram sonegados no ano passado R$ 286,63 bilhões, dos quais R$ 219,65 bilhões por empresas e R$ 66,97 bilhões por pessoas físicas. Especialistas acreditam que a aprovação por unanimidade da Lei Geral das Micros e Pequenas Empresas na Câmara dos Deputados, também conhecida como Supersimples, na última quarta-feira, pode ajudar a reduzir o número de sonegadores. Ele unificará nove impostos e contribuições: seis federais (IRPJ, IPI, CSLL, PIS/Pasep, Cofins e INSS patronal), um estadual (ICMS) e um municipal (ISS).


 




 

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