Avaliação técnica da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) reduziu as resistências das centrais sindicais à proposta do governo de permitir o uso de até R$ 17 bilhões do patrimônio líquido do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) na criação de fundos para investimentos em projetos de infra-estrutura, no âmbito do Programa de Aceleração Econômica e no mercado de ações.
Avaliação técnica da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) reduziu as resistências das centrais sindicais à proposta do governo de permitir o uso de até R$ 17 bilhões do patrimônio líquido do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) na criação de fundos para investimentos em projetos de infra-estrutura, no âmbito do Programa de Aceleração Econômica e no mercado de ações.
Em reunião da qual participaram o presidente da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), Raimundo Magliano, e dirigentes das centrais sindicais, o presidente da CVM, Marcelo Trindade, apoiou a solução dada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva de garantir, por meio da Caixa Econômica Federal, rentabilidade mínima para os recursos utilizados nos fundos, equivalente ao retorno atual do FGTS, que é calculado pela Taxa Referencial (TR) mais 3% ao ano.
Como está previsto que a CEF administrará o fundo, a regulamentação do mercado financeiro permite que a instituição seja a garantidora, o que agradou os líderes trabalhistas. “A regulamentação não proíbe – e existem alguns produtos assim no mercado – que um terceiro dê garantias de rentabilidade a um fundo”, disse Trindade. “O governo colocava para as centrais sindicais que não poderia dar garantia para o fundão”, afirmou o presidente da Força Sindical, Paulo Ferreira da Silva, o Paulinho.
De acordo com Paulinho, “deve ser” a Caixa, como administradora do fundo, a instituição que oferecerá as garantias. Os sindicalistas esperam para próxima semana uma discussão da proposta com representantes do governo.
Segundo os participantes do encontro, o governo poderá criar o fundo com o mínimo de R$ 5 bilhões do patrimônio líquido do FGTS. A garantia da Caixa teria como funding esta parcela. Para o restante dos recursos, que viriam de aplicações opcionais dos trabalhadores, não haveria garantia de rentabilidade mínima.
Outro ponto em negociação, segundo relatou Adeílson Telles, diretor executivo da Central Única dos Trabalhadores (CUT), no Rio, é a possibilidade de o trabalhador usar até 15% de sua conta individual de FGTS para aplicar em obras de infra-estrutura ou na compra de ações no mercado.
Investimento
Deste limite total, está em discussão a utilização de até 10% para aplicações em obras de infra-estrutura do PAC e até 5% na compra de ações no mercado. Estes percentuais representam cerca de R$ 20 bilhões, do patrimônio líquido total do FGTS de R$ 130 bilhões, que poderiam ser injetados no mercado caso todos os trabalhadores aderissem ao investimento. Está também em estudos a proposta de as centrais sindicais criarem um fundo para orientar os trabalhadores e o estimularem a serem cotistas.
Tanto Trindade, da CVM, quando Magliano, da Bovespa, ressaltaram a importância de se discutir o fundo com “precaução” para que não haja uma “oferta artificial” no mercado, a exemplo do que aconteceu em 1967, com o fundo 157. Naquela época, relata Trindade, várias empresas lançaram ações no mercado impulsionadas por incentivos fiscais, mas sem nenhum comprometimento com o mercado de capitais com políticas de boa governança, o que afetou a imagem da bolsa.
“Ter um fluxo de recursos dessa magnitude de uma vez no mercado de capitais pode gerar um excesso de demanda, o que gera uma oferta artificial de valores, com companhias menos comprometidas. Há uma série de coisas que precisam ser aprofundadas nesse tema”, afirmou Trindade. Segundo o presidente da CVM, quando se fala em autorizar investimentos em ações do FGTS, é preciso ter o cuidado de desenvolver mecanismos para preservar o mercado financeiro.
Operações anteriores deram certo
A proposta de garantir rentabilidade mínima para os fundos de infra-estrutura é inédita em aplicações do FGTS no mercado de capitais. As duas operações anteriores, com ações da Petrobras e da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), transferiram todos os riscos para o trabalhador. Até agora, porém, essas aplicações vêm dando bons resultados: desde que foram criados, os fundos Petrobras renderam quase 650% e os da Vale, 730%.
No caso da Petrobras, primeira experiência do governo para atrair os trabalhadores ao mercado de capitais, houve um desconto na compra das ações, o que representou, na época, uma espécie de garantia de rentabilidade inicial. O Tesouro ofereceu 153 milhões de ações da estatal a um preço máximo de R$ 58 cada, mas em caso de compra com FGTS, o valor caía para R$ 46.
Ao final do leilão, em agosto de 2000, o preço para investidores comuns ficou em R$ 43,07. Os chamados Fundos Mútuos de Privatização (FMP”s) com recursos do FGTS pagaram R$ 34,46. Dez dias depois, as ações já valiam cerca de R$ 55 no mercado, o que garantiu um ganho inicial de pelo menos R$ 20.
O desconto, porém, não foi suficiente para atrair muitos trabalhadores para os fundos: apenas metade dos R$ 3,4 bilhões disponibilizados pelo governo foi transferida das contas de FGTS para os FMP”s da Petrobras. Ao todo, 310 mil trabalhadores aderiram à proposta.
Especialistas estimam que o fracasso tenha sido provocado pela falta de conhecimento sobre o mercado financeiro. Com a Vale, a história foi bem diferente. Mesmo sem desconto, a demanda superou em três vezes os R$ 1 bilhão que o governo liberou do FGTS para investir nos FMP”s. Por isso, a volume de ações teve de ser rateado entre os interessados, que puderam ficar com apenas 30% do volume solicitado inicialmente.
Os trabalhadores já haviam experimentado os benefícios das aplicações em Petrobras, dois anos antes, e decidiram aderir em massa. Nos últimos meses, o fundo da Vale vem tendo rendimento bem superior ao da Petrobras, que vem perdendo valor devido à queda das cotações do petróleo no merca do internacional. No Itaú Personalité, por exemplo, os FMP”s de Vale renderam 26,70% nos últimos 12 meses, enquanto os de Petrobras renderam apenas 3,37%.