Trabalho infantil e violência no campo crescem no país

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O Brasil avançou pouco na questão de direitos humanos nos últimos anos. Duas áreas que sempre foram bandeiras do Partido dos Trabalhadores (PT) tiveram desempenho especialmente ruim. A porcentagem de crianças que trabalham pulou de 6,6% em 2000 para 10,3% em 2005. Os conflitos no campo também se intensificaram. Entre 2002 e 2005, 311 pessoas morreram.

O Brasil avançou pouco na questão de direitos humanos nos últimos anos. Duas áreas que sempre foram bandeiras do Partido dos Trabalhadores (PT) tiveram desempenho especialmente ruim. A porcentagem de crianças que trabalham pulou de 6,6% em 2000 para 10,3% em 2005. Os conflitos no campo também se intensificaram. Entre 2002 e 2005, 311 pessoas morreram. Só em 2005 foram 102 mortos no campo, um crescimento de 45,7% sobre o ano anterior. 


“As políticas setoriais dos governos federal e estaduais, que se iniciaram nos anos 90 e antes incorporavam preocupações com direitos humanos ou deixaram de incorporá-los ou foram descontinuadas”, avalia Paulo de Mesquita Neto, coordenador do 3º Relatório Nacional sobre os Direitos Humanos no Brasil, elaborado pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV/USP). 


A Secretaria Especial de Direitos Humanos contesta os dados sobre mortes no campo. Os números da Ouvidoria Agrária Nacional mostram que foram 92 mortes entre 2002 e 2005 e não 311. Nos dados referentes ao Pará, que, segundo o relatório da USP concentrou um terço das mortes (111), o Tribunal de Justiça desse Estado contabiliza 30 mortes no período. 


Mesquita explica que a piora nos indicadores relativos aos direitos humanos ocorreu de forma generalizada pelo país, o que evidencia que ela não está relacionada apenas a uma determinada gestão ou tendência política. “O desrespeito às leis, ao direito de liberdade, à segurança, à vida e ao acesso à justiça estão sendo ignorados”, ressalta. 


Entre 2000 e 2004, o número de homicídios por 100 mil pessoas passou de 26,71 para 27,01, uma alta de 1,10%. Ao mesmo tempo, a população encarcerada aumentou. Em 2005, entre 100 mil habitantes do país, 198,3 estavam presos. Em 2000, esse número era de 142,1 por 100 mil pessoas, o que significa alta de 39,5%. 


Os maiores crescimentos de assassinatos foram observados nas regiões Sul (33,6%), Norte (21,8%) e Nordeste (19,9%). Segundo o pesquisador da USP, as pressões pelo desenvolvimento econômico, especialmente na áreas Norte e Centro-Oeste do país, fazem com que o governo incentive a exploração de atividades econômicas, sem dar atenção às questão sociais envolvidas nessa expansão de fronteiras. 


O resultado, no lado ambiental, é o desmatamento. Na questão humana e social, esse crescimento sem planejamento ou apoio leva a invasões de terras, de reservas indígenas e de reservas ambientais, por exemplo. “Isso já causa uma série de conflitos”, afirma Mesquita. Sem contar as disputas que acontecem normalmente quando novas pessoas chegam em áreas urbanas e rurais já ocupadas anteriormente. 


Em contrapartida, o Sudeste teve o melhor desempenho, com queda de 12,2% no número de assassinatos. A melhora foi influenciada pelo Estado de São Paulo, onde a quantidade de homicídios recuou 12,2% no período. Ainda assim, em termos absolutos, o Estado paulista tem o maior número de homicídios por cada 100 mil habitantes: 32,07, acima da média nacional, que estava em 27,01 em 2004. 


Mas, na avaliação de Mesquita, apesar dessa redução na criminalidade, houve uma política equivocada de encarceramento em São Paulo. No curto prazo, a quantidade de presos diminuiu. Em uma visão de prazo mais longo, contudo, houve um forte crescimento da população presa, “feita sem respeito aos direitos dos presidiários”, diz. 


A redução do número de homicídios ocorreu paralelamente à uma política penitenciária que agravou os problemas carcerários e levou à articulação de presos dentro e fora de presídios. O ápice desse movimento ficou evidente no ano passado, com os ataques realizados pelo Primeiro Comando da Capital, o PCC. 


Paulo Vannuchi, ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos, admite que os resultados trazidos pelo relatório levam as autoridades públicas a reconhecerem a necessidade de novas políticas e novos esforços orçamentários para assegurar o cumprimento dos direitos humanos no país. “Precisamos unir o governo federal, estadual, o Legislativo, o Executivo e, principalmente, o Judiciário nessa questão”, diz Vanucchi. Para ele, um dos motivos principais para o crescimento da criminalidade e do desrespeito a direitos básicos do ser humano é a impunidade. 


A respeito do número maior de crianças trabalhando, Vanucchi explica que esse movimento pode estar ligado ao grande salto observado na atividade de agricultura familiar. “Mas nada justifica que crianças estejam fora da escola”, ressalta. Ele diz que no Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) já está em curso um processo de ampliação do Bolsa Família e a integração desse cadastro com o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil. 


Segundo dados do relatório, o maior avanço do trabalho infantil ocorreu no Nordeste, e passou a atingir 15,2% das crianças em 2004 contra 8,8% cinco anos antes. E é justamente nessa região em que está a maioria das famílias que recebe o Bolsa Família, programa de transferência de renda do governo federal que tem como contrapartida a freqüência das crianças na escola. “Temos que derrubar esses números no mais curto espaço de tempo”, enfatiza o ministro. 


Governo quer criar “Bolsa-Família” para jovens


O governo planeja instituir um programa parecido com o Bolsa-Família para remunerar diretamente jovens que estão fora das salas de aula devido à necessidade de trabalhar para sustentar a família. Esses recursos atingiriam dois tipos de público: jovens entre 15 e 17 anos que abandonaram os estudos e entre 18 e 24 anos que não conseguiram concluir o ensino médio. Para evitar distorções, a intenção é repassar a verba diretamente para o aluno e não para a família. Mas para receber a bolsa o estudante precisará estar freqüentando as aulas. 


Esse é um dos pontos do programa que o Executivo pretende anunciar, até o fim de abril, conhecido como PAC da Educação. Segundo o presidente luiz Inácio Lula da Silva, é uma maneira de “saldar a dívida enorme com o povo brasileiro na área da educação”. 


Para estimular os educadores, consta também do pacote um projeto que o governo deve encaminhar nos próximos dias, em forma de projeto de lei, para definir um piso salarial nacional para a magistratura. Pelos cálculos do próprio governo, atualmente metade dos professores recebe menos de R$ 800. Esses docentes também terão de se atualizar e fazer graduação, pós, mestrado e doutorado. O Ministério da Educação pretende criar mil pólos da Universidade Aberta do Brasil para esse fim. Estima-se que 42% dos professores brasileiros não sejam graduados. 


Ontem, durante a primeira audiência pública com os educadores para debater o projeto, o presidente Lula demonstrou preocupação com esse contingente de jovens que deveriam estar na escola e não estão, seja por necessidades financeiras ou por desestímulo com o modelo educacional adotado. “Nós temos um estoque de milhões de jovens que saíram da escola, que atingiram 15,16,17,18 ou 19 anos de idade. Estão no pior dos mundos. Depois de estar na rua, sem possibilidade de emprego, aparece o crime organizado disputando com as famílias quem vai tutelar esse jovem”, disse. 


Lula também foi crítico com a universalização do ensino ocorrida nos últimos anos, sobretudo durante a gestão tucana. Para ele, a qualidade não acompanhou esse processo de expansão. Para o presidente, “o país está no pior dos mundos”, porque, como as avaliações de ensino são feitas de quatro em quatro anos, durante esse período não há como aferir se as crianças estão aprendendo ou se os educadores, dentro da sala de aula, estão educando corretamente. “E os resultados não são nada animadores.” 


No mesmo evento, o ministro da Educação, Fernando Haddad, anunciou a intenção de promover alterações nas regras do financiamento estudantil, que poderá chegar a 100% da mensalidade. O pagamento será feito por consignação em folha de pagamento, quando o jovem já estiver formado e empregado. De acordo com Haddad, esta será uma boa opção, pois a taxa média de desemprego entre jovens recém-formados é de apenas 2,6%. 


O prazo para o pagamento também será ampliado. “Se ampliarmos o prazo de financiamento, para em torno de dez anos, a prestação que ele pagará por mês será de R$ 100. E o salário médio do recém-formado é de R$ 2 mil. Portanto com 5% da renda, ele honra o financiamento sem nenhuma dificuldade”, explicou. 


Lula disse que o Ministério da Educação, como o da Saúde, não pode ser partidarizado. “Na saúde, se você brincar, é morte. Na educação, se você brincar, é o analfabeto”, disse. Ele pediu apoio dos educadores, lembrando que o país tem uma dívida com a sociedade. “Essa conversa com vocês é para torná-los cúmplices de uma política que não pode ser uma política de governo, tem de ser da sociedade brasileira.” 


 


 


 


 


 


 

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