Durante audiência pública no Senado, advogado da Diretoria Jurídica e Sindical da CNC defendeu análise técnica e apontou falta de farmacêuticos como um dos principais entraves à proposta do PL 2.158/2023
A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) participou da audiência pública realizada na tarde desta quarta-feira, 11 de junho, no Senado Federal, com o objetivo de instruir o Projeto de Lei nº 2.158/2023. O texto propõe alterar a Lei nº 5.991/1973 para permitir a comercialização de medicamentos isentos de prescrição (MIPs) em supermercados que disponham de farmacêutico.
Representando a CNC, o advogado da Diretoria Jurídica e Sindical (DJS) Cácito Augusto de Freitas Esteves fez um pronunciamento técnico destacando preocupações com a viabilidade da proposta sob as óticas jurídica e regulatória.
O advogado ressaltou o papel institucional da CNC como entidade sindical de grau superior que representa, simultaneamente, tanto o setor supermercadista quanto o comércio farmacêutico.
“Quando a gente tem situações em que há aparente confronto, porque o confronto é sempre aparente, a gente atua para harmonizá-lo. A CNC, se ela não faz a análise do ponto de vista econômico, faz do ponto de vista técnico”, explicou.
Segundo Cácito, diante de divergências entre setores representados, a CNC adota um posicionamento técnico para contribuir para a construção de soluções legislativas equilibradas.
Falta de farmacêuticos
A principal crítica apresentada por Cácito ao PL 2.158/2023 diz respeito à carência de profissionais farmacêuticos no Brasil. O advogado argumentou que a exigência legal da presença desses profissionais em supermercados para a dispensação de MIPs não é exequível na prática.
“Uma operação de dispensação da forma hoje estabelecida pelo conjunto normativo é tecnicamente inviável de se realizar no sistema de autosserviço em supermercado. Isso é um fato, não é uma questão de opinião”, afirmou.
Segundo dados citados por ele, existem entre 300 mil e 400 mil farmacêuticos em atividade no Brasil, enquanto há cerca de 122 mil farmácias e drogarias em funcionamento, número que cresce em média 4% ao ano. Considerando as exigências legais de funcionamento e carga horária, Cácito estimou que quase todos esses profissionais já estão absorvidos pelo setor farmacêutico tradicional, sem disponibilidade para novas demandas.
Função estratégica e complexa
Além da insuficiência numérica, Cácito chamou a atenção para o papel estratégico do farmacêutico, que vai muito além da simples entrega do medicamento. Ele ressaltou que a legislação atual exige que o profissional atue como responsável técnico do estabelecimento, implicando controle de estoque, armazenamento, supervisão de atendentes e demais aspectos operacionais.
“O farmacêutico atua como responsável técnico do estabelecimento. Ele não se resume à entrega do medicamento. Vai desde o recebimento, armazenamento, controle de pessoal e equipe técnica”, enfatizou.
Na avaliação da CNC, essas exigências não são compatíveis com o modelo de autosserviço adotado por supermercados.
Proposta alternativa já é praticada no mercado
Embora tenha se posicionado contrária ao projeto em debate, a CNC reconhece a legitimidade dos pleitos do setor supermercadista e apresentou uma alternativa que, segundo o advogado, já ocorre em algumas localidades: a parceria entre supermercados e farmácias.
“Existe uma proposta que harmonizaria os interesses das duas categorias, supermercados e farmácias, por meio de parcerias operacionais. Isso acontece hoje em várias cidades do interior do País, inclusive dentro de redes de supermercados”, disse.
Ele acrescentou que esse tipo de arranjo não depende de mudança legislativa e já está previsto no marco regulatório vigente.
Ao final da sua participação, o representante da CNC reiterou que a análise jurídica da entidade indica a inadequação do PL 2.158/2023 por desrespeitar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade no ordenamento constitucional brasileiro.
“A proposta contida no Projeto de Lei nº 2.158 é absolutamente inadequada do ponto de vista funcional. A iniciativa parte de uma premissa: a presença de farmacêuticos, que, na prática, não se sustenta”, concluiu.
A audiência pública contou ainda com a participação de representantes de entidades das áreas farmacêutica, supermercadista e da saúde pública e será considerada na tramitação do projeto no Senado.