O trunfo da política fiscal

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* por Carlos Thadeu de Freitas Gomes, Chefe da Divisão Econômica da CNC

A inflação ao consumidor segue elevada e persistente, devido aos choques mais recentes e, embora o Banco Central (Bacen) reconheça o alto nível de risco para acirramento das condições inflacionárias, sinalizou a Selic terminal em 12,75% ao ano, na semana passada. A autoridade monetária também reconheceu que o mundo, não somente o Brasil, vai viver um ciclo duradouro de crescimento baixo com mais inflação

A alta dos juros acima de 13% passou a ser considerada no mercado, especialmente após a escalada nos preços do petróleo e alimentos, em razão da guerra na Ucrânia. O tamanho dos reajustes nos preços de derivados do petróleo, por exemplo, foi sentido rapidamente pelos consumidores, que já vinham reduzindo seu nível de consumo antes do início do conflito europeu. Os efeitos disseminados dessas altas em cadeias de produção diversas, nos preços livres, são ainda mais difíceis de serem medidos.

O fornecimento de energia elétrica na Europa, o incremento dos preços aos produtores, e mudanças nas matrizes energéticas em curso em outras economias importantes são outros motivos que elevam o risco para a inflação à frente. Ao redor do mundo, todos os agentes reconhecem a alta incerteza na tomada de decisões, principalmente as que afetam o setor real das economias. Os modelos de previsão estão erráticos acima do normal. O Bacen, nesse contexto, espera que a inflação medida pelo IPCA terá seu pico em abril próximo.

Se por um lado a alta nos preços das comodities acirra a inflação doméstica, por outro, ajuda o desempenho fiscal no curto prazo, ao menos. O preço mais alto do petróleo auxilia a arrecadação pela base de cálculo maior e pelos royalties, por exemplo. Fora isso, o Brasil é exportador líquido de commodities agrícolas, metálicas e petróleo, em que os preços maiores auxiliam as exportações e tendem a potencializar a participação do comércio exterior na atividade.

Os resultados da arrecadação em todos os níveis do governo seguem surpreendendo, em parte pela inflação mais alta e reajustes generalizados nos preços de bens e de serviços.

Mesmo que o governo estude a ampliação de gastos, subsídios e estímulos para frear a escalada dos preços domésticos e socorrer os orçamentos das famílias, o saldo primário favorável ainda este é um trunfo da política fiscal no curto prazo, e deve segurar a necessidade de alta mais expressiva da Selic, como parte do mercado passou a projetar recentemente. Os juros básicos de fato não devem subir mais do que sinalizou o Bacen, mesmo com a probabilidade de 97% de a inflação superar a meta este ano.

Ou seja, Bacen reconhece que a meta de inflação não será atingida este ano, e mesmo assim o considera que o ciclo de alta se encerra na taxa atual. Com isso, a própria dinâmica da dívida publica ganha certa folga, uma vez que quanto maior a Selic, maiores são os juros pagos e os desembolsos com o serviço da dívida pública. O trunfo da política fiscal sem dúvidas é a eficiência da administração do Ministério da Economia.

Vale notar que nos últimos meses, com a alta mais expressiva dos juros internamente, a trajetória da taxa de câmbio surpreendeu, e desde janeiro a taxa de câmbio cai sistematicamente, chegando a encerrar o dia 25/03 em torno de R$ 4,75/US$. Esse movimento de atração de recursos externos tem diferentes motivos, dentre eles a Bolsa brasileira barata, os juros domésticos pelo menos 10 pontos percentuais maiores do que há um ano, e o cenário favorável para o desempenho das contas públicas no curto prazo. O investidor externo está enxergando no Brasil uma opção segura e rentável, até agora, levando o câmbio às melhores cotações desde janeiro de 2020.

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