Emenda 3: projeto alternativo aumenta o poder da Receita

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O governo conseguiu aumentar a polêmica ao enviar ao Congresso Nacional o projeto de lei alternativo à Emenda 3, que impedia os fiscais de multar prestadores de serviços que se organizam como empresas para pagar menos imposto e foi vetada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. É que o texto do projeto, que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, havia anunciado como uma forma de solucionar o problema dos prestadores de serviço, amplia o poder de fogo da Receita Federal contra os contribuintes em geral, não apenas as empresas formadas por profissionais.

O governo conseguiu aumentar a polêmica ao enviar ao Congresso Nacional o projeto de lei alternativo à Emenda 3, que impedia os fiscais de multar prestadores de serviços que se organizam como empresas para pagar menos imposto e foi vetada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. É que o texto do projeto, que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, havia anunciado como uma forma de solucionar o problema dos prestadores de serviço, amplia o poder de fogo da Receita Federal contra os contribuintes em geral, não apenas as empresas formadas por profissionais.


O projeto regulamenta o ainda mais polêmico artigo introduzido no Código Tributário Nacional (CTN) em 2001, conhecido pelos tributaristas como “norma geral antielisão”. Essa norma, que há cinco anos a Receita Federal tenta sem sucesso colocar em prática, foi aprovada na Lei Complementar 104 e dificulta o chamado “planejamento tributário”.


Essa prática – muito usada, sobretudo, pelas grandes empresas com a consultoria de escritórios de advocacia – busca encontrar brechas na legislação para pagar menos imposto ou adiar seu pagamento. Com a regulamentação da norma, os fiscais da Receita ganham poderes para desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de reduzir os impostos a pagar – como uma fusão ou cisão de empresas que traria vantagens tributárias que, separadas, elas não teriam.


O artigo primeiro do projeto afirma que “os atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária serão desconsiderados para fins tributários”. O poder de interpretar a finalidade dos atos jurídicos é da autoridade da Receita Federal. E a regra não afeta apenas as empresas formadas por profissionais, mas todo e qualquer contribuinte, pessoa física ou jurídica.


Em 2002, o governo tentou regulamentar a norma por meio da Medida Provisória 66, mas os artigos que tratavam da matéria foram rejeitados pelos parlamentares. Sem a regulamentação, a Receita não pôde até agora tornar a norma efetiva, o que acontecerá caso o projeto encaminhado na quarta-feira seja aprovado pelo Congresso.


O texto estabelece os procedimentos que os fiscais terão que seguir antes de multar as empresas e desconsiderar os atos e negócios que, na sua avaliação, tiverem sido feitos para reduzir o pagamento de tributos. O contribuinte terá um prazo de 30 dias para se defender, depois de notificado pela Receita. Se a defesa for considerada improcedente, o auditor terá que formalizar uma representação ao delegado da Receita. É ele quem vai decidir, no prazo de 120 dias, se desconsidera ou não o negócio. Na hipótese de desconsideração, o contribuinte terá prazo de 30 dias para pagar as multas e o imposto devido.


A coordenadora-geral substituta de tributação da Receita, Ana Maria Ribeiro Reis, reconhece que a matéria é polêmica, mas afirma que essa é uma tendência no mundo todo. Ela destacou que o projeto apenas regulamenta os procedimentos que terão que ser adotados pelos fiscais. “O que está se regulamentando é o rito do procedimento”, disse ela.


O projeto foi mal recebido por tributaristas. A avaliação é de que ele não resolve o problema dos prestadores de serviço e que o melhor caminho será a derrubada do veto presidencial à Emenda 3 pelos parlamentares. “É uma cópia parcial e mal feita de artigos da MP 66, que em nada resolve a questão substantiva da prestação de serviços de uma pessoa jurídica a outra”, disse o ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, que elaborou o texto daquela MP.


Para Maciel, o projeto é uma evidência clara de que o governo não devia ter vetado a Emenda 3. “Se agora ele pode (autuar o contribuinte) é porque antes não podia. O que a emenda dizia é que antes não podia. É a prova cabal, que a Emenda não poderia ser vetada”, disse.


O ex-secretário afirmou que, ao contrário do que ele mesmo pensava quando estava à frente da Receita Federal, o país ainda não tem nível de maturidade administrativa para disciplinar matéria tão controversa e complexa como a “norma geral antielisão”.


Para o advogado Luiz Carlos Robortella, como já previa o texto original da proposta que criou a chamada Super Receita – que havia sido corrigido pela Emenda 3 – o projeto alternativo encaminhado ao Congresso continua pretendendo dar aos fiscais poderes que são do Judiciário. “Ainda que tenha um procedimento, continua poderosa a prerrogativa da Receita”, disse. “Fica tudo na mesma.”


Oposição reafirma intenção de derrubar veto


A expectativa do governo de “acalmar” os parlamentares da oposição com o projeto que alternativo ao veto da Emenda 3, que impedia os fiscais de multar prestadores de serviços que se organizam como empresas para pagar menos imposto, não funcionou.


Os deputados e senadores apontam na proposta o mesmo tipo de intervenção por parte da Receita Federal que os levou a aprovar a Emenda 3 com ampla margem de votos e reforçou a disposição de parlamentares para derrubar o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.


Para o líder do PFL, senador José Agripino Maia (RN), o proposta anunciada primeiramente pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, não ajuda a quem quer empregar nem a quem quer prestar serviço. “Anunciaram uma coisa e veio outra totalmente deturpada, o que só reforça a necessidade de derrubarmos o veto do presidente Lula”, defendeu.


O líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), aponta dois entraves que, na sua opinião, dificultam debater o projeto de Mantega: a manutenção do caráter intervencionista nas relações de trabalho e a tentativa de ignorar a competência da Justiça em pendências trabalhistas.


Junto com o projeto, também chegou ao Congresso a pressão dos sindicalistas contrários à derrubada do veto. O deputado Paulinho da Força Sindical (PDT-SP), acompanhado de outros representantes das centrais, defendeu junto ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que a derrubada do veto “significará jogar a legislação trabalhista no lixo”. Ele e seus colegas apontaram, ainda, “barbárie nas relações de trabalho e a volta da escravidão, se o veto cair”. Não trataram, porém, da vantagem que eles próprios terão com a derrubada do veto e o provável aumento da contribuição sindical devida por lei por todos os trabalhadores com carteira assinada.


Apesar de ter sido anunciado pelo governo como solução, o líder tucano disse que os termos do projeto não o surpreenderam por um único motivo: “Se eles (autoridades do governo) fossem satisfazer o espírito da emenda, com certeza ela não teria sido vetada por Lula”, alegou.


De acordo com parlamentares, o presidente Renan Calheiros foi um dos primeiros a tomar conhecimento que o projeto de lei encaminhado pelo governo em substituição à Emenda 3, introduzida na Lei da Super Receita, não atende às expectativas do Congresso. A informação chegou até ele minutos antes do início da sessão de leitura dos 28 vetos, entre os quais está o da Emenda 3, que serão votados pelas duas Casas no início de abril.


Mesmo sem tornar pública sua contrariedade com texto, esperado por ele como uma saída de fácil aceitação, o líder do governo, senador Romero Jucá (PMDB-RR), foi enfático ao afirmar que não espera a aceitação integral do texto redigido pela equipe econômica. Segundo ele, o projeto é apenas o ponto de partida de uma discussão que deve levar à reforma trabalhista.

  




 

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