Enfoque errado (A Tarde, 28/10/2004)

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Antonio Oliveira Santos

Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo


Há uma forte corrente entre os economistas que não acredita na eficácia das metas da inflação. Surgida na Nova Zelândia e adotada em outros países, inclusive o Brasil, a meta constituiria uma responsabilidade do Banco Central em não permitir que a inflação ultrapasse determinado limite.

Antonio Oliveira Santos

Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo


Há uma forte corrente entre os economistas que não acredita na eficácia das metas da inflação. Surgida na Nova Zelândia e adotada em outros países, inclusive o Brasil, a meta constituiria uma responsabilidade do Banco Central em não permitir que a inflação ultrapasse determinado limite. Se a meta não for alcançada, a diretoria do Banco Central pode ser demitida.


A meta da inflação não é um instrumento da política monetária e, portanto, não representa uma estratégia de ação. A meta é apenas um indicador, a ser perseguido, utilizando-se, para tanto, os instrumentos clássicos: a taxa de redesconto, os depósitos compulsórios e as operações de mercado aberto (open market). A finalidade desses instrumentos é interferir na taxa de juros do mercado e, através da taxa de juros, afetar o comportamento dos preços. Juros altos equivalem a consumo e investimentos baixos, e vice-versa. Essa é a rationale da política monetária clássica.


Acontece que, na maioria dos casos, e principalmente no Brasil, são as despesas do Governo que constituem o fator preponderante na demanda agregada. Como o Governo, no caso do Brasil, gasta, sistematicamente, mais do que arrecada, é o Governo o responsável por uma permanente pressão inflacionária. Daí que, no nosso caso, o mais importante é a política fiscal. A política monetária vem a reboque, com a finalidade principal de financiar o déficit público, ou seja, promover a colocação de títulos do Governo e administrar a sua renovação.


É evidente que a taxa de juros é uma variável fundamental no comportamento das atividades econômicas. O que se questiona, porém, é que a taxa de juros, no caso do Brasil, sofre uma influência preponderante da política fiscal, e não da política monetária.


Assim sendo, a fixação de metas de inflação pelo Banco Central perde o sentido prático, embora não se possa negar que, efetivamente, exerce um efeito psicológico, de curto prazo, sobre os operadores do mercado.


É importante lembrar que a inflação atual é, em grande escala, condicionada aos choques de oferta e ao sistema de reajustes automáticos dos contratos de serviços públicos, um velho cacoete brasileiro, que descobriu a correção monetária e o sistema generalizado de indexação. Atrelando aos índices de preços, os salários, os impostos, as tarifas públicas e a taxa de câmbio, cria-se um círculo vicioso que tende a perpetuar a inflação, qualquer que seja a política monetária ou fiscal. Foi o que aconteceu no Brasil, a partir dos anos 60, levando a inflação brasileira a 2.700% no ano 1993, completamente fora de controle. O sistema de indexação (correção monetária) pode ter sido de alguma utilidade para a política fiscal, no início  do programa. Depois, e até 1994, foi simplesmente um desastre.


A experiência brasileira, vivida em várias oportunidades em que foram tentados sucessivos planos de estabilização, revela que a correção monetária, em um sistema automático de indexação, escapa a qualquer controle. Dessa forma, é da maior importância pautar os reajustes pelo núcleo da inflação, eliminando as variações extremas, e não pelos índices plenos ou cheios. Ao que tudo indica, especialmente no caso brasileiro, a técnica de medir a inflação pelo núcleo dos índices de preços daria resultados práticos muito mais efetivos do que a filigrana das metas de inflação.


Publicado no jornal A Tarde, Salvador, 24 de outubro de 2004.


 

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