Governo petista admite “bagunça” sindical

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O governo Lula, comandado por sindicalistas, não foi capaz de modificar em quatro anos a “bagunça” que caracteriza o movimento sindical no Brasil.


Alvo de críticas da CUT (Central Única dos Trabalhadores) e do PT no passado, o sindicalismo se mantém com regras que resultam na proliferação de entidades sem representação e de fachada, com interesses apenas no dinheiro dos trabalhadores.


Estima-se a existência de 25 mil sindicatos (patronais e de trabalhadores) no país, segundo informa o Ministério do Trabalho, a partir de arquivos da década de 30.

O governo Lula, comandado por sindicalistas, não foi capaz de modificar em quatro anos a “bagunça” que caracteriza o movimento sindical no Brasil.


Alvo de críticas da CUT (Central Única dos Trabalhadores) e do PT no passado, o sindicalismo se mantém com regras que resultam na proliferação de entidades sem representação e de fachada, com interesses apenas no dinheiro dos trabalhadores.


Estima-se a existência de 25 mil sindicatos (patronais e de trabalhadores) no país, segundo informa o Ministério do Trabalho, a partir de arquivos da década de 30. Entre 2003 e 2006, o ministério concedeu 1.064 registros para novos sindicatos. Somente em 2006, foram 307 registros liberados, quase um por dia -número 24% maior do que o de 2005.


Com os registros, esses sindicatos ficaram autorizados a receber parte do imposto sindical (equivale a um dia de salário). Em 2006, a arrecadação desse imposto foi de R$ 1,073 bilhão.


A expansão dos sindicatos resultou numa espécie de “canibalismo” no meio sindical, segundo advogados, líderes sindicais e membros do governo.


Há 20 dias, o ministro Luiz Marinho (então no Trabalho) disse a uma platéia de sindicalistas do comércio: “Com essa estrutura sindical, continuarão ocorrendo aberrações, pois não é preciso comprovar representatividade. Basta ter lá o registro em cartório. O ministério nega, vem lá o juiz e manda conceder o registro. Então, virou uma bagunça danada. Só se muda isso com nova lei com base na representatividade.”


Disputa


A disputa para representar uma categoria profissional em uma base territorial (município ou região) resulta em milhares de ações judiciais, em troca de acusações entre sindicalistas e em afirmações de que o setor responsável pela concessão de registros se transformou num “balcão de negócios”.


Amadeu Roberto Garrido de Paula, advogado que assessora sindicatos, especialmente na constituição dessas entidades, sugere uma investigação do Ministério Público, uma espécie de CPI no departamento de registros sindicais do MTE.


“O regime que existe lá é antidemocrático. O poder deles é, na prática, maior do que o da Justiça na liberação de registros”, afirma o advogado, que tem uma dúzia de pedidos para abertura de sindicatos.


Desde a Constituição de 88, o ministério está obrigado a conceder registro ao sindicato que foi criado numa assembléia, respeita a unicidade (uma categoria em uma região) e não sofreu pedido de impugnação por outra entidade. Só que, em muitos casos, há dúvidas sobre o cumprimento das exigências.


Resultado: sindicatos acabam nascendo exclusivamente para ocupar o espaço de outras entidades, sem considerar os interesses dos trabalhadores. Há sindicatos sérios, mas estão na casa das “centenas”, reconhecem os sindicalistas.


Quatro meses após assumir o governo, o presidente Lula admitia: “Vamos parar de brincar. A reforma sindical é necessária porque temos apenas 20% dos sindicatos com representatividade.


 Os outros 80% atendem a interesses.” O projeto de lei de reforma sindical -que não refletiu consenso entre trabalhadores, empresários e governo- emperrou no Congresso.

“Continuam as facilidades para os sindicatos que são de interesse do governo”, afirma Luiz Carlos Prates, secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos (filiado à Conlutas), que, desde 2005 enfrenta outro sindicato na sua base: o Sindiaeroespacial, que representa os trabalhadores em empresas de aviação (a principal é a Embraer).


Registro


“Impugnamos esse sindicato, mesmo assim o Ministério do Trabalho concedeu o registro após dois meses do pedido.”


Elias Jorge da Cruz, secretário-geral do Sindiaeroespacial (ligado à CUT), que surgiu em 2005, informa que os trabalhadores do setor não se sentiam representados pela categoria metalúrgica.


 “Vamos devolver aos sócios o imposto sindical que cabe ao sindicato”, afirma Cruz. O Sindiaeroespacial já tem 1.500 sócios.


Há inúmeros exemplos de disputa por base de trabalhadores que se transformaram em trocas de acusações. Em Capivari (SP), o Sindicato dos Comerciários (filiado à CUT) informa que o Sindicato dos Comerciários de Piracicaba teria surgido com base em um documento falso -ambos disputam comerciários da região . A denúncia foi parar na Polícia Federal, que arquivou o caso.


O Sindicato de Piracicaba informa que, como o documento que seria falso é de 1963, cabe à PF a decisão sobre o caso. “Tinha 14 anos naquela época”, diz Antonio Roberto Previde, presidente do sindicato de Piracicaba (filiado à Força).


Se a reforma sindical não sair, o país corre o risco de ter um sindicato de categoria por município -o que seria o limite para o setor, na avaliação de Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese. A fragmentação dos sindicatos prejudica o trabalhador, na sua opinião, porque ele perde força nas negociações com os patrões.


Governo vê excesso de normas sindicais

Secretária-adjunta de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho diz que atrativo para criar sindicatos é o imposto sindical


Uma categoria chega a ter 25 descrições diferentes, o que, diz secretária, cria dificuldade para ministério conceder os registros


Ana Paula Cerca, secretária-adjunta de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho, admite que existe uma “bagunça” na questão de cadastros de categorias no órgão. Há também “sobreposição de normas” para a concessão de registros sindicais, segundo diz.


“Isso tudo dificulta o entendimento sobre os limites de atuação do ministério. Mas, desde 2005, existe uma campanha de recadastramento de sindicatos para corrigir essas distorções.” Até agora, 13 mil entidades já se recadastraram.


Ela afirma que existe um cadastro de sindicatos no Ministério do Trabalho, com informações desde 1931, “que não é confiável”, com mais de 25 mil entidades sindicais, e um universo de mais de 5.000 classificações diferentes para as categorias de trabalhadores.


“Às vezes, uma categoria tem 25 descrições diferentes, como a de metalúrgicos, a de trabalhadores na indústria metalúrgica e a de trabalhadores nas empresas de metalurgia. Percebe a nossa dificuldade?”


Fácil de montar


Para Cerca, é fácil montar um sindicato no Brasil. “Os requisitos para que o sindicato se constitua são: publicação de edital para dar ciência à categoria de que será feita assembléia para estabelecer a fundação da entidade, envio do estatuto para informar qual é a base que o sindicato representa, lista de presença, ata dessa assembléia, taxa de recolhimento do valor equivalente à publicação no “Diário Oficial” e pronto.”


Ela diz que o MTE tenta fazer um “filtro” nos pedidos. “O fato é que, às vezes, escapa. Há dificuldade para identificar se existe uma entidade já representando o sindicato que pede registro. Por isso é dado 30 dias de prazo para o sindicato já existente (com registro) impugnar o surgimento de outra instituição.”


A partir do pedido de impugnação, segundo diz, o Ministério do Trabalho verifica se a entidade que impugnou o sindicato tem registro, apresentou documentos necessários, recolheu taxa e se há conflito de representação.


“Às vezes, o sindicato de indústria quer impugnar o de comércio. Se não há conflito, o registro é concedido. Se há, ou as partes se entendem ou vão à Justiça. É a Justiça que determina o que o MTE deve fazer”, afirma.


O atrativo para criar sindicatos, segundo diz, é o imposto sindical. “Fizemos uma grande discussão sobre isso no Fórum Nacional do Trabalho, elaboramos uma Proposta de Emenda Constitucional e um projeto de lei que está no Congresso. Mas a conjuntura política não foi favorável à implementação desse projeto.”


Festa do peão


Questionada se o governo, mesmo sem aprovação da reforma sindical, poderia barrar o surgimento de sindicatos, que, muitas vezes, só têm interesses financeiros, afirma: “Não podemos barrar nada, não podemos interferir no setor. Se uma assembléia foi fraudulenta, se ocorreu no dia da festa do peão, se o sindicato tem só aparência, se a assembléia ocorreu com três gatos pingados, o Ministério do Trabalho não pode fazer nada. O que podemos fazer, diante de uma denúncia, é encaminhá-la para o Ministério Público fazer a investigação.”


Ouvidoria


Ela diz que os interessados em abrir sindicatos tinham fácil acesso a técnicos do MTE. “O que não quer dizer que havia favorecimentos. Mas dava margem para um possível conflito de interesses. O que fizemos? Construímos uma ouvidoria específica para tratar dos registros. Por e-mail, telefone ou no ministério, a entidade pode obter informações.”


 


 

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