Jornal do Commercio Editoria: Economia Página: A-3
Diante da repercussão negativa à idéia de aumentar o limite de endividamento dos estados, principalmente no Congresso, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, admitiu ontem que o governo vai procurar uma fórmula que ajude os governos estaduais a ter mais dinheiro para investir, mas sem mexer nos contratos da renegociação fechados a partir de 1997 e na Lei de Responsabilidade Fiscal (LFR), de 2000.
Jornal do Commercio Editoria: Economia Página: A-3
Diante da repercussão negativa à idéia de aumentar o limite de endividamento dos estados, principalmente no Congresso, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, admitiu ontem que o governo vai procurar uma fórmula que ajude os governos estaduais a ter mais dinheiro para investir, mas sem mexer nos contratos da renegociação fechados a partir de 1997 e na Lei de Responsabilidade Fiscal (LFR), de 2000.
O outro temor para o recuo tem a ver com o tamanho da conta da dívida adicional que poderia ser contratada pelos estados – cerca de R$ 140 bilhões. “É uma continha salgada”, comentou o ministro. São Paulo, por exemplo, poderia contratar mais R$ 6,5 bilhões em financiamento, enquanto o Rio de Janeiro teria acesso a mais R$ 7 bilhões e a Bahia, a R$ 14 bilhões.
A Fazenda também teme que os governadores diminuam a contribuição deles para o superávit primário – que foi fixado em 3,8% do Produto Interno Bruto (PIB), com 0,9% desse total a cargo dos sstados. O aumento do custeio, no governo federal, provocado pelos reajustes salariais e outras despesas sociais prometidas pelo presidente Lula na campanha à reeleição, ano passado, impõem cautela à negociação para atender aos interesses dos estados.
Apesar da cautela, o ministro Mantega reafirmou ontem que o governo estuda a possibilidade de elevar o limite da dívida dos estados. Hoje, esse limite não pode ultrapassar o valor equivalente um ano de arrecadação. O que está em estudo é elevar esse limite para dois anos de arrecadação, que é o teto fixado na LRF. Essa mudança é defendida por governadores como o paulista José Serra (PSDB) e o mineiro Aécio Neves (PSDB).
Anteontem, Mantega citou essa medida entre as que o governo federal poderia adotar, em troca de apoio dos governadores à prorrogação da Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF) e da Desvinculação das Receitas da União (DRU), por mais quatro anos.
Pagando a Conta
Essa injeção no caixa dos estados provocaria um problema para o governo federal, porque ambos têm de cooperar para cumprir a meta do superávit primário do setor público (a economia de recursos públicos para pagamento da dívida). Se os estados gastam mais, o governo federal obrigatoriamente terá de gastar menos, ou então a meta será descumprida. “Temos de tomar cuidado, porque senão vamos pagar a conta”, comentou, referindo-se ao governo federal. “Se eles (estados) podem gastar mais, nós é que vamos gastar menos”, disse o ministro.
Mantega acrescentou que o governo federal não abre mão de cumprir a meta do superávit primário do setor público, os tais 3,8% do PIB. “Eu quero garantir para a população que o superávit será alcançado de todo jeito. Isso é compromisso do governo federal.” Ele acrescentou que, se o governo federal autorizar os estados a aumentarem sua dívida, o fará consciente de que seu próprio limite de gastos será reduzido.
É por isso que Mantega não é simpático à idéia do aumento do limite de endividamento. “Eu não estou muito propenso a essa possibilidade. De qualquer forma, é uma decisão de governo, não é decisão do ministro da Fazenda. Ainda estamos fazendo estudos detalhados.”
Cobrar Dívidas
O ministro da Fazenda defendeu outras formas de ajudar os estados. Uma delas é criar um sistema que acelere a cobrança da dívida ativa – aquela que os Fiscos cobram na Justiça. A idéia em análise na Fazenda é criar fundos que “vendam” esses recebíveis dos estados, antecipando o ingresso do recurso no caixa.
O secretário do Tesouro Nacional, Tarcísio Godoy, indicou outro caminho pelo qual os governadores podem ter um alívio em suas contas. Em reunião na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, ele observou que muitos governadores enfrentam dificuldades porque o Legislativo e o Judiciário estaduais não observam os limites para gastos com folha de salários. Com isso, o estado tem indicadores fiscais ruins e não conseguem contratar empréstimos externos. “Esse é um dos problemas que fazem parte de menu de discussões internas de como poderemos dar equilíbrio entre os demais poderes com o ente federativo”, comentou.
Nenhuma medida que o governo federal esteja estudando para ajudar os estados passa pelo descumprimento da LRF. “O governo não cogita em alterar ou flexibilizar a LRF. Queria deixar isso muito claro”, frisou o ministro Mantega. Ele explicou que, hoje, os estados estão submetidos a um limite de endividamento que foi fixado no final dos anos 90, dentro do programa de refinanciamento das dívidas estaduais pelo Tesouro Nacional. Porém, a LRF, que é posterior, fixou um outro limite mais elevado. O que está em análise é adotar o limite mais amplo. “O que se coloca agora é perfeitamente compatível com a LRF”, disse. “Não quer dizer que eu vá concordar com isso.”
Governo poderá ter de tomar decisão política
Caso o governo federal decida mesmo ampliar o limite de endividamento dos governos dos Estados, será necessária uma solução política para dar um formato legal à medida. “A parte formal é a última que tem de ser considerada”, disse o senador Francisco Dornelles (PP-RJ). “Se a União e os estados se entenderem, o caminho será encontrado.” As interpretações sobre como formalizar o novo limite são variadas. A leitura mais liberal diz que o Senado, com base na prerrogativa constitucional de zelar pela dívida do setor público, pode autorizar o novo limite com base numa resolução.
No outro extremo, há técnicos que fazem uma interpretação rigorosa. Para eles, fixar um novo limite para a dívida de um governo estadual exigiria modificar os contratos que as administrações estaduais assinaram com a administração federal, no qual se comprometeram a reduzir o débito para o equivalente a um ano de arrecadação – e não dois anos, como se estuda fixar agora. Nesse caso, ao contrário do que diz o ministro da Fazenda, Guido Mantega, seria preciso alterar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), pois ela proíbe a renegociação dos contratos assinados entre o Tesouro e os Executivos estaduais. Eles reconhecem, porém, que essa leitura não deverá ser feita, pois a medida interessa a interlocutores com peso político, como o governador de São Paulo, José Serra (PSDB).
No meio termo, existem interpretações como a do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), que era governador quando a dívida foi refinanciada pelo Tesouro Nacional. Azeredo afirma achar que o novo limite poderia ser fixado por meio de um aditivo ao contrato entre o Estado e o Tesouro. Nesse caso, não seria necessário modificar nem o contrato, nem a LRF. Porém, o novo limite precisaria ser ratificado pelas Assembléias Legislativas. O senador Aloizio Mercadante (PT-SP) avalia que a alteração poderia ser feita por projeto de lei.