O drama da previdência social (Jornal do Brasil, 09/02/2003)

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Antonio Oliveira Santos

Presidente da Confederação Nacional do Comércio


Os números da Previdência Social, no Brasil, são realmente assustadores.Os dados relativos ao ano passado revelam que o INSS registrou um déficit (arrecadação menos benefícios pagos) de R$ 17,0 bilhões, enquanto o déficit relativo aos servidores públicos da União montou a R$ 27,0 bilhões. Incluídos os Estados e Municípios, calcula-se que o déficit total se eleve a mais de R$ 70,0 bilhões, uma soma que vem crescendo anualmente e afigura-se impossível de ser sustentada nos anos vindouros.

Antonio Oliveira Santos

Presidente da Confederação Nacional do Comércio


Os números da Previdência Social, no Brasil, são realmente assustadores.Os dados relativos ao ano passado revelam que o INSS registrou um déficit (arrecadação menos benefícios pagos) de R$ 17,0 bilhões, enquanto o déficit relativo aos servidores públicos da União montou a R$ 27,0 bilhões. Incluídos os Estados e Municípios, calcula-se que o déficit total se eleve a mais de R$ 70,0 bilhões, uma soma que vem crescendo anualmente e afigura-se impossível de ser sustentada nos anos vindouros. O sistema caminha para um impasse.


Na medida em que os números revelam a iminência de uma dramática crise no sistema da Previdência Social, aumenta a percepção, por parte do Governo e da sociedade, de que é imprescindível e urgente uma reforma do Sistema. A causa básica dessa situação é o alongamento da expectativa de vida e, conseqüentemente, o envelhecimento da população.


Paralelamente, o Sistema está eivado de distorções e privilégios, que não podem continuar.

Sem contar os Fundos de previdência complementar privada, existem, no Brasil, dois sistemas: o do regime geral da previdência (RGP), que abrange a força de trabalho do setor privado, e o regime de previdência dos servidores públicos dos três níveis de governo.


No RGP, basicamente, o empregado recolhe ao INSS 11% sobre o salário recebido, enquanto o empregador paga 20% sobre a mesma base. O universo do INSS é muito abrangente, incluindo trabalhadores autônomos, empresários, etc, e, além do mais, obriga ao recolhimento, por parte do pagador, de 15% sobre todas as notas fiscais de prestação de serviços.


O Regime Geral abrange cerca de 20 milhões de associados ativos e talvez um número igual de aposentados e pensionistas. Arrecadou R$ 71,02 bilhões no ano passado e pagou benefícios de R$ 88,02 bilhões, do que resultou um déficit de R$ 17,0 bilhões.


Em verdade, o Sistema INSS é financeiramente equilibrado, pois o déficit mencionado resulta de atividades típicas de assistência social, ou de redistribuição de renda, que deveriam figurar expressamente no Orçamento da Seguridade Social, custeadas com recursos da COFINS, CSLL e CPMF. Somente com aposentados no setor rural, que nunca contribuíram, e com o benefício de renda mínima vitalícia (idosos e deficientes), o RGP despende anualmente mais de R$ 16,0 bilhões.


Por outro lado, o Governo conseguiu dar um passo importante para solucionar algumas questões fundamentais do setor privado, ao estabelecer que a aposentadoria, no RGP, passe a ser calculada pela média de 80% dos maiores salários de contribuição, a partir de junho de 1994, além de introduzir um “fator previdenciário”, para definir o valor da aposentadoria, que será diretamente proporcional à idade e ao tempo de contribuição e inversamente proporcional à expectativa de sobrevida do segurado, na data da aposentadoria. Com isso, criou um incentivo para a permanência do trabalhador em atividade e ampliou o benefício, que, de um modo geral, deverá atingir mais de 80% da média do salário-contribuição.


Com relação aos servidores públicos, o Governo fixou os limites de idade e o tempo de contribuição mediante a Emenda Constitucional nº 20/98, segunda a qual, como regra geral, o servidor pode aposentar-se, com o salário integral do cargo, aos 60 anos de idade e 35 anos de contribuição, se homem, ou 55 e 30, se mulher. O servidor tem, ainda, a opção de aposentar-se com menor tempo de serviço, recebendo proventos proporcionais ao tempo de contribuição.

Permanecem, como exceção, os professores dedicados à educação infantil e ao ensino fundamental e médio – a grande maioria – para os quais os requisitos de idade e tempo de contribuição são reduzidos em 5 anos.


A EC nº 20/1998 previu, ainda, a possibilidade de unificação dos dois sistemas previdenciários, público e privado, mediante criação de fundos de previdência complementar. Entretanto, o projeto de lei complementar enviado ao Congresso Nacional não conseguiu aprovação, pelo que cogita o Governo de retomar esse objetivo, baseando-se, agora, no projeto de lei nº 166/1999, de autoria do deputado Eduardo Jorge, do PT. A tese é a mesma: unificar os sistemas, com vistas a desonerar a União, os Estados e os Municípios do pesado déficit que hoje suportam.


Ao que tudo indica, o novo projeto vai enfrentar os mesmos obstáculos do anterior, tendo em vista as dificuldades de se equacionar o período de transição, face ao conceito do “direito adquirido” ou do “direito acumulado”, assim como todo o elenco de privilégios que tornam o atual sistema insustentável.


É evidente a necessidade e a urgência de uma reforma do sistema previdenciário, buscando uma solução compatível com a realidade brasileira. Entretanto, a nosso ver, a solução procurada não tem que, necessariamente, passar pela unificação dos sistemas, o que poderá aumentar o grau de complicações. A exemplo do que já foi feito pela EC nº 20/1998, tudo indica que os resultados desejados poderiam ser alcançados simplesmente pelo alongamento dos limites de idade e tempo de contribuição. Assim, por exemplo, poder-se-ia partir de uma regra básica, segundo a qual “o direito à aposentadoria integral só se adquire aos 70 anos de idade e 40 de contribuição, tanto no RGP, como no regime dos servidores públicos. As opções por limites mais baixos ficariam condicionadas à redução proporcional dos benefícios, como parece ser o objetivo financeiro do Governo.


Em todas as hipóteses, as regras de aposentadoria seriam uniformes para homens e mulheres. A diferenciação atual é absolutamente contraditória, quando se sabe que a expectativa de vida das mulheres é 5 anos superior à dos homens.


Da mesma forma, devem ser extintas as pensões integrais. Pensionistas não deveriam receber mais do que 60% do valor dos vencimentos ou dos proventos da aposentadoria dos respectivos instituidores. As exceções seriam tratadas em lei especial, como a dos militares, profissões insalubres ou com elevado risco de vida, etc.


A nosso ver, estas sugestões encurtarão o caminho da Reforma da Previdência e a tornarão factível, diante dos obstáculos do “direito adquirido”.


Publicado no Jornal do Brasil de 09/02/2003, Caderno Opinião, pág. A-14.

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